Mais um projeto de desfile.
Só que esse foi especial.
Especial por que foi a partir dele que se formou o Grupo de Estudos em Design de Moda da FBV.
Começamos em Maio as reuniões e discurssões a respeito de vários outros projetos.
Na pauta "Fenneart", precisávamos escolher o tema e definir de onde partiria nossa linha de criação.
Pra conseguir trilhar o rumo certo fomos incubidos de várias missões. Dentre elas a realização de pesquisa de tendências para o Verão 2009, montagem de um dossiê disso tudo (foto na lateral da pág.) contendo essas informações e realização de uma palestra sobre o tema para todos os alunos da faculdade interessados no que vem por aí em materia de moda.
E a proposta inicial era sempre trabalhar em grupo criando, realizando e fortalecendo o espírito de equipe e a integração entre todos os membros do grupo. Interagindo entre as experiências, vivências e, principalmente, criatividade de todos os períodos participantes.
O tema da feira era "Nas suas mãos, pelas mãos de quem faz". Sabendo o quanto a região nordeste é rica em elementos de inspiração e criação que possibilitam fugir do comum e do artesanal normal (que sempre tem e com certeza teria de novo na própria feira), foi aí que surgiu o tema "As Flores do Sertão" sugerido por Marinho. Nada melhor poderia ser, pois imediantamente tínhamos a conexão de milhões de imagens e referências entre o Universo Feminino, a Moda e as Flores. e tudo mais.
Imediatamente, posterior à outra imediação (eufemismos à parte), assim, em reconexões de filamentos de memória esquecida sem prestar muita atenção, provavelmente por outro motivo de prioridade no acaso, me lembrei do projeto de fotografia de Lucy - 'O Jardim Secreto' - onde ela estava reunindo um acervo de flores existentes nas regiões áridas do alto sertão, por onde passava em campanhas arqueológicas.
Sim!
Eram as Flores do Sertão!
Olha só que coisa!
O universo conspira em um único e profundo sopro.
E, se não me falhe a memória ou a extenção proeminentemente criativa e dissertativa dela, ela pretendia exatamente mostrar que no sertão não só havia chão rachado, galho seco, espinhos perfurantes no embrenhar mato a dentro e dentre outras coisas que o estereótipo criado e sedmentado em nossa memória inconsciente e inquestionante coletiva das coisas do nordeste, a monocromia terrosa.
Voila!!
Menina, que coisa 2!!
Ofereci ajuda a Ozi pra diagramar a apresentação e resolvemos unir nosso material de pesquisa e ministrar a palestra juntos.
A dele de tendência de moda, cores, formas, tamanhos e afins e a minha de público, comportamento, ideologia, inpirações, arte e conceitos
(adoro antropologia, cês sabem né?) =]
Daí então foram noites, madrugadas e lindos amanheceres filmados e fotografados pra registro, lembrança e aproveitamento da oportunidade de um dia relembrar aquilo que não será de novo do jeito que foi ontem e ainda hoje de manhã a pouco, em claro.
E aproveitando pra meditar, energizando com os primeiros raios de sol. é claro!
Ah, se eu ainda lembrasse da sequência do surya namascar...
Com sucesso, ministramos a palestra e apresentamos as Flores do Jardim Secreto de Lucy Lima e a inspiração correu solta, leve, suave, perfumada e colorida.
Só faltou uma música de fundo pra fazer trilha sonora pros olhos atentos e brilhantes, mas que foi substituída por suspiros de "onnwww..." e "ai, que lindo!"
Minha inspiração
Eram tantas flores lindas, belas e coloridas...
Mas eu, como sempre, escolhi o diferente. o feio. o esquecido. o sem graça. o apagado. o monocromático. o desacreditado. o escanteado. o nada.
Porque?
Sei lá!
Por tudo.
Acho que pra mostrar a poética que canta nos meus ouvidos quando olho pro "diferente".
Acredito que a beleza existe em tudo no mundo e se expressa de todas as formas. Principalmente na natureza, onde tudo ecoa a sinfonia matemática exata divina do universo e dos organismos complexos.
E isso me faz preferir olhar com meus próprios olhos e pensar o que sinto, sentindo o que vejo (sem eufemismos 2).
[Daqui a uns dias, provavelmente eu apago isso de vergonha ou arrependimento censural-profissional-ético. ou não.
políticas também castram.]
Voltando à inspiração...
Essa foto coloquei na abertura da apresentação do Jardim.
Justo porque simbolizava a nossa 'embrenhada' no sertão mar a dentro.. ops! areia a dentro. ou seriam espinhos?... enfim.
Pra descobrir o que há por trás de tanto galho e mato seco.
Pra convidar os espectadores-criadores a lançar um olhar a + ao redor. E se deparar com o surpreendente.
O pleno e livre exercício da observação, para criação, segundo Paulo Freire, Henri Matisse, Andrea, Painho, Vó.. e outros mestres.
Foto: Lucy Lima
O Lagarto Papa-vento fica no meio dos galhos com a boca aberta, que se enche de ar, deixando-o com o pescoço inflado.
Hábito genético e pré-histórico.
Foto: Lucy Lima
A segunda foto que usei como inspiração foi a dos 'parasitas' nas árvores (acima).
Fascinante como a vida nasce e sobrevive da 'ajuda' de todos no ecosistema.
E como os tufos do parasita parecem ser parte da árvore. parecem as flores dela.
O conceito
No conceitual é possível se mostrar todos os elementos, cores e formas de uma coleção e ainda expressar o seu sentimento e entendimento da pesquisa sobre o tema.
Isso me encanta e me permite arte.
Acreditei que o conceitual do nosso desfile poderia ter a mesma proposta que lancei na apresentação de comportamento.
De re-criar.
De re-pensar.
De re-ver o conceito de sertão seco sem flores.
O fabuloso prefixo "RE" que também pode ser "DES".
Apenas simplesmente olhar com outros olhos.
E mais ainda, de mostrar que as flores também podem ter formas e cores diferentes do habitual e do comum.
A criatura
Foto: Edna Maria
Inspirada no lagarto e nas 'flores de outras formas', a gola e as barbatanas laterais representam o papo do lagarto.
A pintura riscada marrom-terra representa os galhos secos.
Os botões bordados em linhas diversas e assimétricas, se confundem com o desenho da pele do lagarto, como com as pétalas longilíneas das flores parasitas.
Mas o principal é que o vestido, de base e forma reta sessentista (corpo do bicho e troncos das árvores), foi costurado pelo avesso e com acabamento grosseiro, aliás, sem acabamento. Pra ilustrar o avesso da concepção (ou pode também ser o lado verso) estereótipada de que no sertão não tem flor nem beleza e tampouco feminino. que dirá moda?
Ela vem descalça e com os braços e pés sujos do barro seco do sertão, pra ilustrar o caminhar e a simplicidade do ambiente original.
Tudo isso feito em tecido fino com efeito metalizado, pra contrastar dualisticamente com o despojado.
Palmas de agradecimento ao profissionalismo da modelo Maria Helena, que entendeu e representou bem o personagem da roupa, fazendo o charme e o balanço necessário para bater as 'asas' da roupa, no ritmo certo.
=]
O Stylist do Desfile
Optamos por fazer borboletas e beija-flores de origami em papel vegetal.
Pois são eles os bichinhos que, além de delicados, femininos e lindos, acompanham as flores em qualquer lugar do mundo.
O origami foi a técnica que possibilitou-nos criar a partir das nossas mãos algo simples e singelo que encantasse de forma sutil, assim como a beleza das flores. Além de fazer uma homenagem ao aniversário da imigração japonesa e ainda pegar carona na tendência oriente.
A escolha do papel vegetal foi pela necessidade do neutro, já que as roupas tinham muita informação e deveriam ser a 'estrela do espetáculo' e também pela aparência de tecido de seda leve e transparente.
A nossa idéia original era por montes suspensos em bases de arame para que eles se movessem com a brisa do caminhar das modelos e pendurá-los nos cabelos, punhos e pescoços com fios de nylon para que 'voassem' atrás das 'flores'. Mas no fim, DEScontruímos tudo espalhando-os no chão.
A Trilha Sonora
Primeiramente pensamos em algo regional erudito como Sagrama e outros sons armoriais. Mas isso não traduzia as flores, apenas o sertão. E pra não confundir o desfile com algum stand da feira, optamos por algo um pouco mais atual.
O projeto 3namassa foi perfeito como uma luva de cetim com strech: feminino, moderno, excitante e sofisticado.
Mesclamos com a trilha do filme Amelie, pra arrematar o delicado erudito criando o clima noir de sedução francesa que faltava pra temperar tudo.
E também entrou um trecho de Maquinado que levantou e hightechizou o negócio.
Conclusão
Acredito que a escolha do tema foi feliz por que as flores traduzem o universo feminino em todas as suas qualidades e adjetivos.
E com a moda se assemelham, além das qualidades femininas, quanto a sua EFEMERIDADE e resultado penúltimo de um processo cíclico e poético no seu propósito final.
E que foi realizado um trabalho de equipe e criamos e estreitamos laços de amizade e profissionalismo.
E é claro que não posso deixar de agradecer aqui, a ajuda dos amigos de fora que se sensibilizaram e se disponibilizaram a ajudar de alguma forma. Sugerindo. Revisando o release. Montando a trilha conosco... tudo de livre e boa vontade pelo simples ato de ser solidário com o próximo. Mesmo que isso tenha custado um certo tempo dispendiado. E em especial, à Lucy Lima por ter nos cedido e confiado o seu acervo fotográfico para servir de fonte de pesquisa e inspiração.
Obrigada a todos!
=]
Um comentário:
Adorei,talento é isso," tirar leite de pedra" Dani e seus tons terrosos.Beijo sou sua fã Milena
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